Sumário
Introdução
O presente caso trata de anulação de contrato em face de uma prática mercadológica desleal cujo objetivo é confundir empresários, enganando e persuadindo-os a preencherem um contrato de serviço de marketing digital.
Funciona assim: os golpistas ligam para as empresas e de forma bem persuasiva levam as vítimas a preencherem um formulário com as informações atualizadas da sua empresa, as informações são, na verdade, parte do golpe.
Em alguns casos, os golpistas se passam por funcionários públicos e dizem que a vítima está com o cadastro desatualizado perante a receita federal e que para atualizá-los seria necessário preencher e assinar um suposto formulário.
Em outros casos, os golpistas persuadem os empresários a preencherem o formulário para atualizarem as informações das empresas perante os mecanismos de busca e listas telefônicas.
Formulário fraudulento
Ocorre que o formulário possui cláusulas de adesão escrita em termos e grafia de difícil compreensão e que, em muitas vezes, não atraem a atenção da pessoa que assina.
O formulário é, na verdade, um contrato de adesão de serviço de “marketing digital”.
O uso de engenharia social confunde a vítima, que acaba sedendo e assinando o formulário. Em muitos casos, as vítimas chegam a pagar as mensalidades que lhe são impostas, até perceberem que o caso se trata de um golpe.
Execução da dívida por inadimplência, pode?
Quando o empresário deixa de pagar as parcelas, a empresa golpista entra em contato e ameaça com ações judiciais e com a inclusão do nome do empresário em cadastros de inadimplentes.
Nosso escritório já lidou com situações onde os golpistas simulam serem oficiais de justiça buscando bens a penhora pela inadimplência do contrato fraudulento.
Convém ressaltar que o formulário preenchido pelo empresário, a princípio é um título executivo extrajudicial apto a ser levado a protesto em cartório, de tal modo que muitos empresários são surpreendidos com cartas de cobrança de protesto de títulos, ações de cobrança ou até mesmo inclusão em órgãos restritivos ao crédito.
Fundamentos jurídicos para anulação de contrato fraudulento.
Apesar disso, o contrato de adesão firmado fraudulentamente é nulo de pleno direito, pois não foi celebrado de forma livre e espontânea, mas sim por meio de engenharia social e persuasão, maculando a eficácia do negócio jurídico pela ausência de consentimento.
Inobstante, por se tratar de uma relação de consumo, para celebração de um contrato dessa natureza exige-se a observância de uma série de parâmetros, sobretudo no que tange a redação do contrato.
A título de exemplo, o Código de Defesa do Consumidor (CDC) exige que o contrato seja redigido em linguagem clara, de fácil compreensão e com letras escritas em tamanho 12.
Precedentes nos tribunais para anulação de contrato.
Vale dizer que esse assunto não é novo nos tribunais, como se vê no Acórdão julgado pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, em sede de apelação, os desembargadores concordaram que:
- Na celebração desses contratos, existem omissões dolosas com intuito de levar o consumidor a erro.
- O método usado pelas empresas são coercitivos e desleais.
- Os golpistas apresentam discurso incisivo, vago e impreciso, sem esclarecer o consumidor sobre as consequências da sua declaração de vontade.
- Normalmente, o pretexto para a assinatura do contrato é de “atualização cadastral” ou de “renovação de contrato”, a princípio sem custo financeiro.
- No mesmo julgado, os desembargadores concluíram que existe a possibilidade não somente de desfazimento do negócio jurídico, mas também de aplicação de danos morais e materiais a depender do caso concreto.
No nosso escritório, percebemos que os golpistas possuem diversas pessoas jurídicas, que reproduzem os mesmos formulários em diferentes marcas d’água e que estão sempre amparados juridicamente.
Tudo é feito com o cuidado de deixar parecer uma prestação de serviço legítima.
Negócio jurídico de acordo com a teoria de Pontes de Miranda
Contudo, o negócio jurídico exige a observância critérios para sua validade. Nesse sentido, o clássico jurista Pontes de Miranda concebeu a Teoria da Escada Ponteana, segundo a qual, para que um negócio jurídico seja válido, é necessário que observe determinados critérios.
No presente caso, o critério da vontade está no plano da existência. Quando a vontade do contratante é eivada de vícios, o negócio jurídico é considerado inexistente, não ultrapassando sequer o primeiro degrau da escada Ponteana.
No presente caso, o critério da vontade está no plano da existência. Quando a vontade do contratante é eivada de vícios, o negócio jurídico é considerado inexistente, não ultrapassando sequer o primeiro degrau da escada Ponteana.
Sendo assim, a anulação do contrato na situação descrita acima, pode ser alvo de judicialização para ser anulado e em alguns casos, obter o ressarcimento dos valores pagos a título de pagamento pela suposta prestação e, ainda, indenização por danos morais.
Conclusão
Em resumo, o caso descrito é um golpe conhecido como “GOLPE DA ATUALIZAÇÃO CADASTRAL OU DA LISTA TELEFÔNICA” e que tem como objetivo enganar empresários para que assinem um contrato de adesão fraudulento.
Tudo isso ocorre por meio de ligação telefônica, onde os golpistas persuadem a vítima a preencher um formulário, que, na verdade esconde um contrato de adesão de serviço de “marketing digital”.
Por se tratar de negócio jurídico celebrado com diversos vícios formais e materiais, ele pode ser desfeito judicialmente com a anulação do contrato, cabendo apenas ressaltar que cada caso deve ser analisado de forma individualizada, a partir das provas que forem coletadas.
Referências
JUSBRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível n.º 70072925258. Disponível em: Link. Acesso em: 01 dez 2022.
RODRIGUES, MARIO. Publicação Jusbrasil. Imagem escada ponteana. Disponível em: Link. Acesso em: 01 dez 2022.
PEXELS. Imagem em destaque. Disponível em: Link. Acesso em 01 dez 2022.